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Monday, August 11, 2008

Esta noite




... Marília sonhou que andava há 3 dias de safari pelo Quénia.

Muitas cobras no horizonte e leões também.
Fez festas às girafas e deu de comer a um gorila.

No sonho havia também o namorado, o Dinis.
Estava moreno e os olhos verdes pareciam deslumbrar mais agora naquele tom bronzeado.

Dinis tirou imensas fotos e bebia litros de água, derreado por baixo dos taipais que modestamente faziam sombra aos 50ºC que derretiam a savana. Ainda assim sorria-lhe.

No hotel, a ventoinha do tecto não os refrescava, apenas espalhava o ar quente, o que vinha de fora entrando por todas as frestas do quarto e o que emanava dos seus corpos suados.
Deliciosamente lutavam com a rede dos mosquitos que se lhes entrelaçava pelas pernas sempre que ali se refugiavam para ceder à vontade, à líbido, ao amor que os unia... várias vezes por dia.
Marília vivia o paraíso na selva.

Malas feitas, seguiram viagem para satisfazer outro prazer comum: o windsurf. Ali perto tinham Zanzibar, na Tanzânia - mais que perfeito!

Os ventos quentes queimavam-lhes os corpos que, já bem bronzeados, magnificamente deslizavam nas águas.
Águas cristalinas, límpidas, perfeitas para a prática e para eles.

As praias de areia branca eram o seu refúgio para o refrescante passeio de todas as noites, mão dada, sempre juntos, sempre apaixonados, sempre felizes.

Nestes sonhos não há dores de costas nem de dentes, nem apertos de estomago pelo preço das viagens.
De certo que quem visse Marília a dormir, notaria o sorriso bem generoso na face.

Já acordada pelo malfadado despertador, livre de mosquitos, pó e areia, percebeu que afinal não saíra do seu quarto.

O mesmo que acolhe Dinis, seu marido faz 12 anos e que no vil acto das sextas-feiras à noite, os recebe com todo o conforto.


Poucas palavras proferidas.
O stress matinal nem tempo deu para um beijo de despedida: "- Até logo - qual seja a hora a que venhas esta noite..." de novo.

Marília jurou continuar este sonho - com ou sem Dinis, esta noite.

Monday, September 17, 2007

Histórias de Embalar (Cap. XII)

" - Boa tarde Sr Cardoso, que tal vai isso?", cumprimentava Pedro, sem suspeitar de nada, ao avistar o Cmdt Cardoso chegando à vinha.
Pedro verificava com minúcia o estado das uvas depois da geada da noite anterior e estava todo contente: nem um arranhão, a colheita vai ser das boas, pensava ele.

Cmdt Cardoso vinha com um ar sério, " - Venho falar-lhe da Katya ! "

Pedro mudou imediatamente de expressão “ - Sr Cardoso, não estou interessado em saber nada dessa aldrabona!”, retorquiu.
" - Mas vai-me ouvir Pedro, vai-me ouvir!“ disse Cmdt Cardoso com firmeza na voz.

Pedro viu que não havia nada a fazer e por respeito resolveu anuir, até podia ser que o homem fosse rápido.
Levou-o para o salão da casa. Ofereceu-lhe um Whisky. Cmdt Cardoso, apesar de não beber há anos, aceitou. Deu um trago e começou a contar tudo.

No final, Pedro com desdém, pergunta " - Foi ela que mandou o Sr vir aqui dizer essas aldrabices todas ? O que é que ela quer com isso, hum ?"
E antes que Pedro pudesse abrir a boca de novo, Cmdt Cardoso interrompe-o: "- Homem, cale-se e oiça ! " e continua " eu não vim aqui a mando de ninguém, Deus sabe a minha integridade que sempre soube manter em todos estes anos de carreira ! Vim aqui para lhe dizer que a mulher que você julga que o enganou, foi raptada para lhe tirarem um rim e que viveu estes meses todos sem dizer nada sob pena que lhe estragassem a vida a si ! Fez tudo só para o proteger ! E a causa disto tudo foi o meu filho ! " gritava já fora de si.
" - Ainda acha que vim contar histórias ?!?" continuava, apesar da respiração sofrega lhe começar a pregar a partida de ir perdendo o folego para continuar.

Pedro que sempre conhecera o Cmdt Cardoso por ser um sujeito pacato, viu que realmente ele estava a falar a sério e resolveu deixá-lo terminar sem mais interrumpções. Até porque nem conseguia dizer o que quer que fosse.

" - Que faz você nesta grande casa, consegue sózinho fazer disto um Lar, hein ? Consegue ?! Sem Amor de nada servem as suas posses, Pedro. É na partilha com quem amamos que residea grande parte da nossa felicidade. Se não se entregar como é que vai saboreá-la ?" e Cmdt Cardoso terminou acrescentando " - O meu filho fez a maior asneira da vida dele, mas por amor à mulher, para salvá-la. Se você não salva a sua, essa vai ser a maior asneira da sua vida!".

E sem mais nada, pousa o copo que tinha na mão e sai direito ao portão da quinta sem nunca, uma vez só, olhar para trás, deixando assim Pedro sem palavras.
A sua missão estava cumprida.

Pedro dividido entre a raiva e o ódio ao filho do Cmdt Cardoso; entre a alegria de que tudo tinha sido mentira ; entre a vergonha e remorso por não ter acreditado na mulher que mais amava ; entre a maravilha de ser pai, pai da pequena Benedita; entre o que fazer e não fazer... num turbilhão de pensamentos, chega sempre à mesma conclusão: que sem o seu anjo ruivo nada fazia sentido, nada interessava.

Dez minutos depois tomou o rumo de Lisboa, em busca dos seus anjos.


E viveram os três na mansão, conseguida a custo, muito custo... e felizes para sempre.


FIM

Thursday, September 13, 2007

Histórias de Embalar (Cap. XI)

"- Pedro nunca me iria acreditar!", começou Katya pausadamente, como que tentando controlar o pranto “eu podia ter ligado a pedir ajuda, a contar-lhe tudo. Mas Luis ameaçava-me que incendiaria as vinhas e as Caves e isso seria a ruina de Pedro… tive medo!" disse rendida, começando a soluçar e limpando com a mão livre as lágrimas que desabavam pela cara abaixo.

“ - Ele acreditou naquela historia, no que dizia aquela carta e se assim foi, é porque não me amava, era porque não nos mereciamos” continuou ”portanto, eu nao podia apresentar queixa do seu filho. Afinal ele fez tudo isto por amor à mulher..." continuava em soluços "... e por isso resolvi não fazer nada. Se ao menos o Pedro me amasse assim!…”

Nesse instante Benedita, a bébé, dá sinal e lembra que são horas de se alimentar.
Katya é acompanhada por um dos agentes para uma outra sala, mas antes de sair olha para Cmdt Cardoso e no meio daquele pranto ainda consegue oferecer-lhe um sorriso sem rancor e foi assim que o comandante percebeu que Katya era mesmo um anjo, um anjo ruivo.

Os agentes aguardam impavidos por Cmdt Cardoso que depois de recomposto finalmente lhes diz : " - Preciso sair , Lopes…preciso sair !" e levanta-se meio atordoado. Estupefacto, o amigo pergunta-lhe "- Mas não quer ir falar com o seu filho antes?! "
Cmdt Cardoso diz… "- Obrigado, Lopes, obrigada, mas há coisas que precisam de ser feitas!".

E sai, tomando o rumo de Santarém.

(continua)

Monday, September 10, 2007

Histórias de Embalar (Cap.X)

Katya sob a pressão e a ameaça de Luis, ficou a trabalhar na clínica e foi lá que Benedita nasceu. A filha do seu grande amor, Pedro.

Cmdt Cardoso mais uma vez desarmado com toda a história, tentava a custo reflectir sobre tudo que ouvia. Afinal é uma menina, pensava ele enternecido, ... e não é minha neta!, entristecia-se de novo, relembrando de tudo que ouvira…

O seu filho cometera um crime por amor à mulher, dera cabo da vida de duas pessoas que se amavam, por amor à sua mulher e… "- E onde está o meu filho ? " insistia de novo o Cmdt Cardoso, mas já nervoso.

"- Seu filho está sob prisão preventiva desde ontem, Cardoso !", afirmou um dos agentes, "como todos os crimes, nenhum é perfeito e nós interceptamos um telefonema do seu filho para a mulher em que combinavam encontrar-se num hotel em Monsaraz ontem. E quem lá estava à espera, eramos nós !", explicou o agente.
"- O seu filho", continuava o outro agente, " confessou tudo e pode ser que se safe. A Dª Katya não quer apresentar queixa. "

Cmdt Cardoso estupefacto, fitou Katya numa tentativa de com o olhar lhe perguntar porquê e ao mesmo tempo agradecer e pedir perdão por tudo que o filho lhe fez, mas não havia maneira dela tirar os olhos do chão.

Mesmo assim e tremelicando as palavras pela emoção, insistiu e acompanhado com a mão no ombro que, entretanto, o amigo agente lhe colocara em jeito de solidariedade, pergunta " - Porquê ? Porque é que não apresentou queixa, depois de tudo que lhe fizeram ? depois de tudo que perdeu por isso ?"

Foi então que finalmente Katya levantou a cabeça e falou.

(continua)

Saturday, September 08, 2007

Histórias de Embalar (Cap. IX)

No dia da alegada fuga do casal, Katya fora apanhada de surpresa no estacionamento do hospital quando se dirigia para o seu cabriolé.
O colega Luis, cirurgião e filho do Cmdt Cardoso, tentara persuadi-la a celebrarem com um chá, a notícia da sua gravidez. Ela recusou dizendo que estava com muita pressa para ir dar a novidade ao pai do bébé, Pedro. Mas Luis voltou a insistir dizendo que era rápido e ela acabou por anuir.

Foram até ao bar, estranhamente não havia ninguém. Katya não ligou, bebeu o chá e não se lembra de mais nada a não ser de acordar numa cama envolvida por um cheiro familiar: era éter.
Reparou então que estava toda ligada e a dor que sentia nas costas começava a ser cada vez mais forte: "- Meu Deus, tiraram-me um rim ! ", apercebeu-se finalmente Katya.

Luis deu conta que Katya acordara e tentou sossegá-la, dizendo que nao poderia fazer muitos movimentos, sob risco de hemorregias.
O rim era para sua mulher que estava a morrer e não tinha dito nada a ninguém.
A única pessoa compatível que ele tinha encontrado era precisamente Katya (ele constatara isso pelas análises que ela tinha pedido no hospital).

Quanto mais o agente falava, mais boquiaberto ficava o Cmdt Cardoso.

Luis aguardava apenas o tempo suficiente para poder voltar e encenar um pedido de perdão dizendo que estava arrependido da fuga com a amante e tudo voltaria a ficar bem aos olhos dos vizinhos. Katya deixava de ser problema já que com a vergonha e a ameaça, não voltaria de certeza e com os 30 mil Euros que Luis lhe dera, seguiria a sua vida fora de Santarém.
Mas a sua esposa opôs-se a este final, ela estava em Santarém e sabia o que se passava no seio da família : se ele voltasse iria haver chacina. A história que engendraram não fora afinal a melhor de todas, se bem que salvara Rute, a mulher de Luis… mas arruinara a vida de Katya e Pedro.

"- Então… então e como é que a Katya está aqui ? E onde está o meu filho?" perguntava o Cmdt Cardoso sem saber o que mais dizer, tal era a confusão na sua cabeça.

Katya permanecia calada, as olheiras disfarçadas pelo creme de hipermercado e o semblante tenso, não enganavam a profunda tristeza que sofria.

Luis cuidara que Katya recuperasse sem problemas nem pra ela, nem para o bébé. Tinha uns amigos em Badajoz e fora lá que tudo se passara. Licença sem vencimento do hospital de Santarém e uma candidatura aceite à pressa na Clinica de Badajoz.
Foi aqui que Rute foi passar um mês para descontrair , como disse à familia e afinal ser operada – com sucesso.
Regressou sózinha, sem Luis, era preciso pensar noutra historia mais convincente.


(continua)

Friday, September 07, 2007

Histórias de Embalar (Cap. VIII)

Pedro organizava mais um concurso, claramente numa tentativa de se preencher, de ocupar todo o seu tempo com coisas e afazeres para não ter um segundo, um segundo que fosse que voltasse a pensar em Katya e em tudo o que ela fora capaz de fazer.
Mas era inútil, as noites eram longas até adormecer e nem a sua Ghiri, a cadelinha rafeira qual clone da velha Lassie dos tempos de garoto, o conseguia ternurar.
Ghiri, em honra dos valentes samurais, os tais da lealdade, tal como a sua cadela.
Pêlo fôfo e branco, doce e meiga, Ghiri era uma boa companheira, "muito melhor que Katya! Sim, muito melhor que essa mentirosa!", pensava Pedro, até que o cansaço lhe pregava a partida e Pedro caía em sono profundo.

Passados uns meses, numa segunda-feira cheia de sol, Cmdt Cardoso fora chamado a Lisboa: notícias frescas sobre a investigação.

Chegado à PJ, Cmdt Cardoso cumprimenta os amigos, vira-se para se sentar e de repente… nem queria acreditar ! De fronte para uma janela, podia ver uma silhueta familiar, talvez mais magra e tinha um bébé ao colo – era Katya e claro, só podia ser o seu netinho !!

Cmdt Cardoso não conseguia dizer palavra.

Katya voltou-se e olhando de frente Cmdt Cardoso baixou os olhos e sentou-se na cadeira que o agente lhe estendia. O bébé dormia, cobria-lhe a cara uma fralda muito usada, mas via-se que estava bem nutrido. Katya parecia ter envelhecido uns dez anos.
O agente estende outra cadeira ao Cmdt Cardoso que continuava incrédulo, inerte, boquiaberto e pede-lhe para se sentar.

A história ía começar.

(continua)

Tuesday, September 04, 2007

Histórias de Embalar (Cap. VII)

O seu filho Luís, cirurgião obstetra do hospital da cidade, mandara entregar uma carta em que se despedia dos pais dizendo estar apaixonado por um anjo ruivo – a mulher da sua vida – e que ela trazia no ventre o seu filho.
Mais não podia dizer, a não ser que logo dava notícias… quando fosse possível.
Luís, deixava a mulher e Mirinha, a filha de ambos com 3 anos.
E o anjo ruivo deixava Pedro.

Sem forças e incrédulo perante tudo o que o Cmdt Cardoso contava, Pedro instintivamente tenta ligar para Katya "- Por favor, atende, por favor atende ! Isto não é verdade, isto não é verdade ! " soluçava Pedro enquanto trémulo, tentava ligar para o número que teimava em não responder.
Cmdt Cardoso envergonhado pela atitude do filho, recolhe-se para dentro da viatura da GNR e Pedro soltando um grito de dor e chorando compulsivamente, cai pelo chão quente e viril da lezíria, da sua quinta, do lar que construira para si e para o seu grande amor.

O tal a quem ele tinha aberto as portas do seu coração… para ser dilacerado.

Passaram-se alguns meses e Pedro vivia sózinho na sua grande mansão. Conseguida a custo, muito custo.

Mas Pedro vivia intensamente, continuou a trabalhar arduamente na quinta, nas Caves da família. Ajudava os filhos dos empregados com a matemática lá na escola. Fazia festas e concursos d’O Melhor Vinho da Região e dos fundos uma parte dava às vítimas das cheias do rio e outra à Câmara, na esperança de que o espólio gótico que se vai degradando pela incúria, fosse dalguma forma recuperado.

Tornou-se uma das presenças obrigatórias na sociedade filantrópica da região.

Pedro, porém, não tinha resolvido ainda uma questão : a mentira !
Não conseguia ainda entender porque Katya o tinha abandonado, porque ela tinha outro homem, porque ela lhe tinha mentido ?! E grávida do outro ?! Como é que é possível, tanta mentira?! Que arda no Inferno !! Bolas ! Nunca mais! pensava ele, agora é que nunca mais ele iria abrir o seu coração. Nunca mais !

Paralelamente, Cmdt Cardoso, não ía descansar enquanto não soubesse do paradeiro do filho: " - Um homem casado, com uma boa posição, uma boa situação financeira e faz isto ?! Que vergonha, como posso eu sair à rua ? Com que cara eu falo com as pessoas ?" indignava-se, desabafando com a mulher.
Dª Rita chorava, noite e dia, de vergonha das vizinhas também, mas calava, nada dizia, era seu filho.

E a um filho, nunca se deixa de ter amor.

Cmdt Cardoso tinha uns amigos na PJ em Lisboa e a eles recorrera em segredo, até da sua mulher. Estava determinado a fazer justiça, mm que caísse sobre o seu filho, ai se ía !

Veio a Lisboa numa tarde chuvosa e fria. Duas horas depois estava de volta a Santarém.

(continua)

Thursday, August 30, 2007

Histórias de Embalar (Cap VI)

Os resultados tinham acabado de chegar, Katya a receio abriu a carta que dizia... estava grávida !
Pulos de contente, abraçou as colegas numa contagiosa euforia tal que todo o serviço, emocionados, partilhavam da mesma alegria.
Katya tinha conquistado para além do coração de Pedro, o dos colegas e das crianças dali do hospital. Ela era meiga, atenciosa e muito amiga. Todos a adoravam.

Ansiosa por dar a notícia, resolveu ir pessoalmente. “- Preciso ver a cara dele, quando lhe disser! », pensava ela em êxtase e correndo para o seu Opel Corsa Cabriolé contando acelarar o ronco do motor nem que fosse até à linha vermelha .

Enquanto isto Pedro, trabalhava para que tudo estivesse pronto para logo à noite. Para a inauguração da nova casa, da nova mansão.
Sabe Deus conseguida a que custo. Era a inveja contida dos vizinhos, dos lavradores da região.

Oito da noite, hora marcada para a grande festa e já se avistavam alguns convidados a chegar ao fundo da quinta. A casa estava linda.
Pedro tivera o cuidado de não esquecer nenhum pormenor desde a decoração do jardim, à decoração da sala, à escolha das flores, às ementas e acepipes, tudo estava impecável.

De Katya nada.
Pedro falara com ela pelas 4 da tarde, dissera que ía já sair do hospital para fazer umas comprinhas e que logo voltava para casa – tinha boas notícias, mas não dissera o quê.
Pedro não era curioso, mas sentira pela sua voz que iria ser o dia mais feliz da sua vida.

Chegados os primeiros convidados Pedro começou a ficar preocupado. Não ter ali a seu lado Katya estava a ser muito desconfortável.
Já tinha ligado para o telemovel umas 3 vezes, mas devia estar sem bateria, porque dava logo o voice-mail… Valia-lhe a Dª Firmina, a governanta do vizinho que lhe viera dar uma ajudinha e que sabia receber como ninguém.
Reformada, mas ainda toda rija, Dª Firmina tinha sido a Directora de Banquetes do Palácio da Ajuda, em tempos que já lá vão.

Mais convidados ao fundo da quinta, ao longe não dava para perceber quem eram. Pedro não gostava de penetras e sentia que ía ter problemas.
Chamou um dos capatazes e fez-se ao terreno para interceptarem a meio caminho os não convidados. Mas não eram intrusos, era a GNR.

Pedro conhecia o Sr Cardoso, o Comandante da GNR de Santarém. Trazia uma tez sombria e pelo modo como pegava no chapéu e pela secura da boca, Pedro sentiu um nó no estômago e um calafrio arrepiante pela espinha acima.


Cmdt Cardoso trazia más notícias.

(continua)

Friday, August 17, 2007

Histórias de Embalar (Cap V)

Sempre que as folgas permitiam, os dois deliciavam-se nos braços e nos carinhos um do outro.
Katya encontrara a chave do coração de Pedro e estava determinada a abri-lo e a lá ficar para sempre.
Pedro perdido no turbilhão de sentimentos que ainda o prendiam ao passado, levemente deixou-se ir e quando deu conta tinha o seu coração escancarado de novo, aberto a um novo amor, aberto a uma nova vida, aberto para ser feliz… e deixou-se ir. Ele queria ser feliz, merecia ser feliz.

Ao fim de 8 meses, viviam juntos. Malas feitas. Contas fechadas no Luxemburgo.
De regresso à terra natal, Pedro apresentou Katya à Dª Teresinha.
A velhota só chorava, "- de alegria tanta !", como ela não parava de dizer enquanto enxugava as lágrimas ao pano da cozinha e sonoramente limpava o nariz, vermelho de tanta emoção.

Era um dia feliz. Pedro estava feliz.
Pagou tudo a Dª Teresinha. E seguiram para Santarém.

Santarém, essa antiga Scalabis dos Romanos ou a Santa Irene dos Alanos, cenário rico da arquitectura gótica de outrora, onde o Tejo teima em regar as suas margens ciclicamente enriquecendo as lezírias… e a vida de Pedro.


Relegadas à degradação, Pedro recupera uma das quintas de seus pais e arduamente, de sol a sol, consegue replantar as vinhas e trazer de novo a azáfama e o maravilhoso odor aos lagares das Caves da família.
O sucesso da produção da casa agrícola permitiu a Pedro pagar todas as hipotecas e recuperar a pouco a maioria dos seus bens.

Mas só um interessava – o seu anjo ruivo.
Só o amor que nutria por Katya o fazia mover, o fazia viver, sempre com aquela vontade, aquele desejo, aquele conforto de a saber por perto, de a saber sua.

Katya conseguira uma boa colocação no Hospital Distrital de Santarém e já era Enfermeira Chefe no Serviço de Pediatria.
Mas de há uns dias para cá que não se sentia muito bem.


Decidira fazer umas análises, afinal trabalhava num hospital.

(Continua)

Thursday, July 19, 2007

Histórias de Embalar (Cap III)

Dia e noite. Trabalhava Pê na oficina "Merveille du Portugal": a oficina de Tonito. Dia e noite.

Ao fim de 3 meses, Pê conseguira juntar o suficiente para pagar a Dª Teresinha pela estadia na sua pensão e ainda assim começar a endireitar a sua vida.

Para ele era duro, uma prova bem dificil, mas iria suportá-la.

Nunca tinha percebido o quão dificil era trabalhar horas e horas e receber pouco, não ter folgas, nem festas, nem alucinantes, nem amigalhaços para jogar, nem Porsche Carrera para se regozijar de cabelos ao vento como antigamente, nem tempo para engatar miúdas e nem apetite para as procurar. Depois de Táta, nada nem ninguém o poderiam voltar a satisfazer. Até porque Pê não se queria mais satisfazer.

Reparara que afinal era a sua escolha e sentia-se bem assim, sózinho.

A sua única necessidade era alimentar a alma de esperanças e alentos. Os afectos estavam fechados numa caixa e a chave, perdida em nenhures... assim pensava Pê.

Tonito e Pê tinham-se tornado amigos, mas não como os outros, os da outra época.

Com Tonito, Pê podia falar de si próprio que alguém ouvia e se interessava; não escondia o seu passado; tinha sido aceite pelo que ele era e demonstrava ser e não pelo que possuia, que aliás, era agora nada.

Tonito não era bem o anjinho que Dª Teresinha pensava, mas era um bom amigo e um bom patrão e isso é que importava.

Começou a ter folgas de vez em quando e aproveitava para dar uns passeios pela cidade.
Luxemburgo era um meio pequeno, mas era um novo grande mundo para si e Pê voltara a ser: Pedro!

Certo dia, num dos seus passeios pelo parque, dois individuos de estatura mediana, larga e roliça, abordaram Pedro.
Queriam cigarros, Pedro não fumava.
Queriam dinheiro, Pedro não tinha e o cerco apertava mais.

Até que Pedro tentou empurrá-los do seu caminho e de um dos bolsos saiu um calibre 45, luzidio e poderoso e bem apontado ao seu fígado.

Pedro relutante parou e tentou conversar, mas nada os demovia e nesse mesmo instante só sentiu uma coronhada na cabeça e cair, como que para dentro dum poço frio e escuro, onde tudo se apagou de repente.
(continua)

Tuesday, July 17, 2007

Histórias de Embalar (Cap II)

"- Dª Teresinha!", voltou Pê a gritar.

Assustada, a velhota acudiu escada a cima a correr, o mais possivel que as pernas corcumidas pelo tempo lhe permitia: "- o que se passa, menino?".

"- Dª Teresinha", disse Pê ainda meio zonzo do que acabara de fazer, "o seu filho lá no Luxemburgo tem uma oficina de automóveis, não tem?"

"- Tem sim, menino", retorquiu a velhota já mais descansada, mas ainda assim atarantada com todo aquele aparato que via pela nesga da porta da casa-de-banho. Mas falando do seu filho, Dª Teresinha esquecia tudo o resto.
"- Graças a Deus, teve muita sorte e muita cabeçinha e está bem na vida. É ele que me aguenta aqui a pensão, menino. Manda-me dinheiro todos os meses, nunca falhou, o meu querido filho do coração.
Ele bem queria que eu fosse para lá viver com ele, mas sabe menino, aqui é que é a minha casa, onde eu sempre vivi toda a minha vida, onde o criei sabe Deus com que dificuldades, desde que o meu Francisco faleceu.
O menino lembra-se do pai do meu Tonito, lembra-se?"
Pê engoliu em seco e abanou a cabeça que não e desviou o olhar para o chão (lembrava-se sim, perfeitamente, bem de mais! Apanhara-o uma vez aos apalpões a uma das cozinheiras, ali mesmo no meio pátio. Não fora o carinho que tinha pela Dª Teresinha, naquele mesmo dia teria feito queixa à mãe e os dois estariam no meio da rua).

A velhota embalada pelas lembranças e pela emoção continuava sem parar "... tinha 49 anos quando Deus mo levou. Foi o pior dia da minha vida.
Não podia continuar na mansão, menino, as lembranças eram muitas e por isso que saí de lá. A sua mãezinha bem me chamava, mas eu não conseguia.
O meu filho, o meu Tonito, esse anjinho... é muito meu amigo... o meu bébé!"
E com isto, veio à memória de Dª Teresinha todas as dificuldades por que passou, a saudade do marido e a do filho lá tão longe.

"- Mas a vida é assim, é como Deus quer!", assim se conformava Dª Teresinha.

Apressadamente, Pê interrompe a nostalgia e retoma "- prometo Dª Teresinha, que este será o último favor que lhe peço. Eu vou para o Luxemburgo e trabalho para ele. Dia e noite. Prometo pagar-lhe tudo o que lhe devo a si e para endireitar a minha vida de novo.
Começar de novo, é isso, começar de novo!" repetia Pê, como se assim acreditasse mais fácilmente em si próprio. Mas Pê estava decidido. Iria começar de novo, sim.

"- Ó meu rico menino!", suplicava Dª Teresinha com as mãos em oração viradas para o céu, "mas não foi esse futuro que a sua mãezinha tanto ansiou para si. O menino é um doutor, não é para sujar as mãos em óleos e aquelas coisas dos carros", continuava a velhota ainda incrédula da vontade de Pê.
"- Não precisa pagar nada, logo há-de conseguir o lugar de volta no banco. Não tem que me pagar nada, menino!" dizia ela.

Carinhosamente Pê tentava convencê-la, "- A minha mãe também não queria que eu fosse um irresponsável arrogante e leviano, e foi no que me tornei ao ser doutor, Dª Teresinha. Foi ao que me levou tanto dinheiro que ganhei. Perdi tudo e quase pûs termo à vida e isso é a maior estupidez e cobardia. A pior atitude da minha vida, mais fundo não poderei ir."
E continuava, " preciso andar para a frente, Dª Teresinha e por isso lhe peço que me deixe sujar as mãos. Eu faço o que for preciso. Trabalho digno e honesto fará de mim um novo homem."

Dª Teresinha em lágrimas e rendida à energia que Pê irradiava ao falar, dirigiu-se para o telefone e ligou ao Tonito, ao seu bébé, ao seu bem sucedido bébé!

"Toniiito? É a mãe, querido....!"

(continua)

Wednesday, July 11, 2007

Histórias de Embalar

Pedro vivia sózinho na sua grande mansão.

Conseguida a custo, muito custo.

Era a inveja contida dos vizinhos, dos lavradores da região.

Passaram-se 10 anos desde que Pê (era como os amigalhaços lhe chamavam) decidira largar a vida da cidade, metrópole dos horrores da noite, dos vícios carnais e mundanos, das longas horas de jogo, alcool e sexo...

Pê pertencia à administração dum pequeno banco, mas o ordenado era de Lorde e como Lorde ele vivia e gastava. No jogo, na dose e com Táta.

Táta, deusa, louca e divertida Táta.

Não a podia chamar de namorada, ele desconfiava que ela dormitava com a melhor amiga dela e tb um colega lá da Editora. Mas isso não importava a Pê, ele era doido por ela e não a largava nem por nada.

Ela tinha sido a única que até aquele dia, lhe tinha vindo a proporcionar os melhores orgasmos como nunca ninguém antes. E se ele teve outras antes...

Táta era sensual, divina mestre da arte, trabalhava-o ao ponto de ele se desprender da alma e o seu corpo virar marioneta de prazer lascivo nas mãos dela. Com ela ele derretia e era assim que até gostava de morrer, enterrado nos seus fluídos, ensurdecido pelos guinchos libidinosos e perdido fálicamente no tempo.

Pê sabia que isso era o máximo que Táta podia dar: bom sexo, alias extra-fenomenal sexo, nada mais... e afinal nada mais interessa, só complica, só atrapalha.

Pê passava no supermercado para comprar mais garrafas de Cardhu e de caminho parava na farmácia do Sr. Mário para novo stock de seringas. Ía buscar Táta às 20h30 e quem trazia o "material" era Carlão, o tal que ele desconfiava. E era assim todas as 5as feiras.
Festa rija! Sempre.

Até que, até que a dose lhe começou a atordoar os sentidos e a razão, perdendo a cada semana mais que na anterior. Hipotecou a casa, vendeu as jóias, os terrenos, o seu Porsche Carrera, tudo que o dinheiro tinha podido comprar.

Até que os ciúmes se apoderaram cada vez mais dele deixando-o no limiar da loucura, do desespero pela perda de Táta.
E assim se viu sem nada, sem dinheiro, sem o Porsche Carrera, sem os amigalhaços... e sem Táta.

Viveu uns dias na Pensão da Dª Teresinha, por caridade.
A senhora tinha sido governanta da mãe e tinha pena do menino e albergava-o como se dum próprio filho se tratasse.

Pê nem queria acreditar, tinha perdido tudo.
Os amigos nunca mais o quiseram ver e pior que tudo: veio a saber que Táta tinha engravidado de Carlão.

Nesse mesmo dia, Pê resolveu cortar os pulsos.
Fechou-se na casa-de-banho, água a correr na banheira, post-it no espelho com a mensagem "Merda para todos vocês!" e ... e... não conseguiu!

Pê ficou a olhar o espelho, e.... não conseguiu.

Arrancou o post-it amarelo, deitou-o para a sanita, voltou a olhar para o espelho e pensou: "- Não foi para isto que eu torrei as pestanas a estudar, não foi para isto que me puseram no mundo! Não! Não me vou enterrar mais! BASTA!"

Limpou a cara do suor, do choro e ranho que os nervos e o desespero tinham encoberto e dali triunfantemente gritou: "Dª Teresinhaaa!! "

[Continua]